quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

5: COISAS DO CORAÇÃO

Já se cansava o dia quando chegou Joezito à bagunça que se chamava de vilazinha. A bruxa era quem tinha dito onde achar a gente e tinha valido pelo menos por isso a pena ter (se) fodido. Tinha? Joe viu aquilo pouco e se lembrou da Cidade e ficou meio desconsolado pensando onde caralho é que eu vim parar, my god. Queria poder desmorrer e desnascer voltando pro corpo da Mãe, e pra poder esquecer esse freudinismo que ele sempre achara um saco, sentou no banco de uma bodeguinha pra tomar uma cachacinha e fumar um cigarrinho.

Ficou por ali, pitu numa mão derby na outra, olhando os sertanejos que escorriam pela terra batida, achando tudo aquilo mezzo melancólico, mezzo pitoresco. Mas reparou que de quando em quando passava umas menininhas gostosinhas, que a princípio animaram, mas depois fizeram lembrar de Jéssica, a amada que o abandonara pra ficar com a vida, e aí ele desanimou outra vez e chorou, mas um pouquizito só, pra que nenhuma dessas pessoas incompreensíveis zombassem do fato dele ser só um cara sensível.

Só que se o amor une a pitu separa, e foi quando depois de meia dúzia de garrafas ele viu uma morena faceira dos cabelos cacheados que ele levantou de súbito exclamando quando vê a perfeição o homem sábio se move morena do rabo grande eu quero ser o seu love e a menina bamboleou as pernas porque não há mulher por mais feminista que seja que não se desmanche por um poeta. Joe levou ela prum canto e comeu muito.

Quando o sol descansou e lambeu a cara de Joe ele acordou com os óio amargando e a boca que não enxerga nada, maldizendo do fundo da alma o filho da puta que inventou o só mais uma dose, eu agüento. Mas foi quando ele olhou pro lado que ele percebeu o quanto a realidade é maleável e que se a fenomenologia não convenceu muito foi porque ela não usou como argumento o elemento pitu. Do seu lado estava a mulher mais feia que ele já tinha comido, levando em consideração que a velinha estava mais pra uma espécie de gnomo. Feia e provavelmente muito sonsa ou cínica, pois não percebeu a cara de nojo de Joe e sorria como que apaixonada. De fato: acordou querido?, e Joe: eu queria que não!, e ela: sabe, eu nem ia sair de casa ontem, mas acho que o destino me fez mudar de idéia, e por isso eu resolvi passear pela rua, e Joe: eu queria que não!, e ela: sabe, você foi incrível ontem, o melhor de todo o mundo, e Joe, com o ego meio inflando: hé, eu queria que não..., e ela: sabe, faz muito tempo que eu pedi a minha deusa por um amor, será que você é ele?, e Joe, se levantando pra sentar pelado, pose de canalhão, acende um cigarro, dá um trago, sopra a fumaça: é que eu não costumo me apegar facilmente às pessoas...

Pra tudo há limite até mesmo pro coração in love, e essa a moça não agüentou. Com os olhos molhados de ódio e indignação levantou-se com tudo gritando papaaaaai e a porta explodiu com o bico de um gigante de chapéu terno e bigode gritando mas que porra é essa? Era o pai da moça e o que Joe não tinha como saber é que o gigante era o coronel da vizinhança que mandava e desmandava nas almas da região. Ao ver aquele neguinho pelado na cama com a filha pelada o Coronel ficou vermelho e babou: seu filho da puta, o que foi que tu fez?, e ela: ele me desvirtuou, paiê, e Joe: mas foi sem querer!, e ela: e não quer casar!, e o Coronel: agora tu vai ter que casar muleque, senão eu te capo e te fodo com teu pau, e Joe: eu caso, eu caso, eu caso!

Mas o Coronel não queria casar a filhinha com um menino de rua qualquer, feio sujo e pobre, e pensou em matar Joe de qualquer jeito, mas a filhinha ia ficar muito tristinha a coitada, e ele teve que usar a superioridade intelectual dos mais ricos pra achar solução, achou: muleque, tu acha que as coisas são assim, que tu pode comer minha filha e virar meu genro pra depois ficar com minhas terras e meus sertanejos, tu ta muito enganado cabra safado, pra poder casar com minha filha vai ter que provar que é macho, não, nem adianta fazer essa pose agora, esconda essas suas vergonhas que homem nenhum banca o foda pelado na frente de outro homem, tu vai ter que fazer mais do que levantar o pau, vai ter que mostrar que tem coragem e que é forte, é o seguinte, minha cidade ta sendo ameaçada por uns desordeiros de merda que roubam as coisas dos meus súditos, ninguém consegue mais juntar nada aqui porque eles tomam tudo, e só quem tem o direito concedido por Deus de roubar dos outros aqui sou eu, então o senhor, seu maloqueiro, pra provar que é macho e digno da minha flor, vai ter que acabar com a praga desses bandoleiros malditos, porque senão quem vai acabar com a praga de tu sou eu mesmo!, e Joe que não podia fazer muita coisa concordou na hora e ainda fez pose de macho pra não ficar muito por baixo do discurso do gigante. Assim o Coronel solucionava o problema porque não tinha condições de Joe acabar com mais de duzentos bandoleiros, informação preciosa que ele tinha esquecido inocentemente de anunciar.

A vilazinha então viu nascer seu novo herói, e foi com um pouco de pena que ela viu Joe partir pra sua peleja fadada à desgraça. Mas antes de ir Joe subiu num palanque e fez um discurso que ficou marcado pra sempre na memória do povo da vilazinha:

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